July 03, 2017

As contenções fixas não previnem as recidivas: Um estudo de longo prazo.

As contenções fixas não previnem as recidivas: Um estudo de longo prazo.

Um dos maiores desafios do tratamento ortodôntico é conseguir se manter os efeitos do tratamento. É surpreendente como o nosso nível de conhecimento sobre os aparelhos de contenção ainda é baixo, mesmo após tantos anos de pesquisa. Esse novo artigo, publicado no AJO, nos fornece informações interessantes, mas talvez desapontadoras.

Stability of orthodontic treatment outcome in relation to retention status: As 8 year follow up.

Jenette Steinnes et al

Am J Orthod Dentofacial Orthop 2017;151:1027-33

http://dx.doi.org/10.1016/j.ajodo.2016.10.032

Um grupo de Tromso, na Noruega, fez este estudo interessante. Na introdução, eles ressaltaram que as contenções fixas são as mais usadas na Noruega. Porém, existem poucos estudos de longo prazo que avaliam a sua efetividade. Eles procuraram responder a seguinte pergunta:

“Qual é a estabilidade dos resultados do tratamento ortodôntico e como a contenção se encontra após 7 ou mais anos da colocação das contenções fixas?”

O que eles fizeram?

Eles identificaram uma amostra de pacientes que foram tratados por eles no serviço de ortodontia pública entre 2000 e 2007. Ao início, todos os pacientes apresentavam mais de 4 mm de apinhamento inferior ou superior e precisavam ter a documentação completa. Foram encontrados 105 pacientes elegíveis para os quais foram enviados convites perguntando se eles poderiam participar de um exame de acompanhamento. Quando os pacientes retornaram para essa consulta, os autores fizeram moldagens para a confecção de modelos de gesso e coletaram os dados sobre a progressão do tratamento, o tipo de contenção, o grau de cooperação e o nível de satisfação com o tratamento. Em seguida eles analisaram os modelos de estudo utilizando o índice PAR e o índice de irregularidade de Little.

O que eles acharam?

Sessenta e sete pacientes (64%) compareceram às consultas. O tempo médio entre o fim do tratamento e a segunda coleta de dados foi de 8,5 anos. Noventa por cento dos pacientes tinham utilizado a contenção fixa inferior. Na maxila, 54% usaram a contenção fixa e a removível, 39% usaram somente a removível e os demais ou não usaram a contenção (4%) ou usaram apenas a contenção fixa (3%). Alguns pacientes já tinham parado de usar a contenção ou ela havia descolado. Isso significou que eles tiveram uma amostra de pacientes com e sem contenção no retorno. Portanto, eles puderam fazer comparações entre tais grupos para identificar o efeito da contenção.

Eles forneceram uma grande quantidade de detalhes sobre as mudanças dentárias ocorridas com o uso da contenção e eu as resumi na seguinte tabela:

RetainerNo Retainerp
Maxilla0.761.150.33
Mandible0.651.820.001
Years qualifiedExtractionNon-Extraction
Less than 15 years54 (15%)285 (85%)
Greater than 15 years75 (27%)193 (73%)
Total129 (21%)478(79%)

Eles também encontraram que não houve diferença na quantidade de recidiva na maxila entre os pacientes que usaram e os que não usaram as contenções, o que significa que elas não preveniram a recidiva. Eu acredito que isso tenha sido devido às falhas na colagem etc. Mas eles não forneceram detalhes adicionais sobre isso.

Quando avaliaram a satisfação do paciente, a maioria estava satisfeita com os resultados do tratamento. Porém, mais da metade percebeu que os dentes haviam se movimentado após o tratamento.

O que eles concluíram?

Eles concluíram que:

1          A recidiva dentária ocorre independentemente do uso da contenção no longo prazo.

2          A contenção fixa é efetiva na mandíbula, mas ela parece não fazer diferença na maxila.

O que eu pensei?

Eu achei um artigo interessante que delineou um projeto ambicioso. Olhando para os resultados, foi interessante ver que, apesar da maioria dos pacientes ter usado os aparelhos de contenção, a recidiva média nos índices PAR foi de 14%. Isso é clinicamente significante, mas pode ser o resultado de pequenos fatores, como por exemplo, o apinhamento moderado dos incisivos inferiores e o aumento da sobremordida.

É importante ressaltar que o uso do aparelho de contenção superior não influenciou nas alterações que ocorreram nos incisivos superiores. Porém, os pacientes que não usaram a contenção fixa inferior tiveram uma recidiva significativamente maior.

Quando lemos um estudo como esse, precisamos interpretar os resultados pensando sobre alguns pontos importantes, como:

Tamanho do efeito e intervalos de confiança

As diferenças que foram detectadas entre os grupos foram bem pequenas. Por exemplo, a quantidade de recidiva, de acordo com o índice de Little, foi somente de 1 mm. Eu não sei bem se isso é clinicamente significante. Os intervalos de confiança também são amplos o que mostra que existe alguma incerteza nos dados.

Pontos fortes

Foi um estudo ambicioso que avaliou um grande número de pacientes com diferentes níveis de sucesso no uso dos aparelhos de contenção. A escolha das medidas avaliadas foi lógica. O índice PAR mediu todos os componentes da recidiva e o índice de Little foi direcionado para a recidiva visível dos incisivos. Eles também utilizaram a satisfação do paciente como um resultado que é relevante para os nosso pacientes. É interessante que os resultados refletiram a experiência clínica, uma vez que existiu mais recidiva nos incisivos inferiores.

Fraquezas

Foi um estudo retrospectivo e um dos critérios de seleção foi que os pacientes tivessem boa documentação. Isso introduz o viés de seleção, pois não sabemos ao certo o motivo de alguns pacientes terem a documentação completa e outros não.

Ainda que a taxa de resposta tenha sido alta, devemos supor que aqueles que retornaram para o acompanhamento foram diferentes daqueles que não retornaram. Isso chama-se viés de resposta e é importante. Por exemplo, é mais provável que os pacientes que apresentaram recidiva retornem. Por outro lado, os pacientes que retornaram podem estar satisfeitos com os seus resultados de longo prazo e querem compartilhar isso com os ortodontistas!

Juntando as informações…

A minha sensação é que esse é um estudo que pode ser considerado “o melhor que podemos ter”. Eu acho que ele fornece informações úteis e reforça que a recidiva é inevitável, principalmente nos incisivos inferiores. Ele também mostra que o conceito de utilizar a contenção por longo prazo não deve ser a resposta para prevenir a recidiva. Porém, existe um grau de incerteza devido aos métodos e à taxa de resposta. Assim, cabe a você decidir se tais achados são importantes.

Vamos ver se teremos uma boa discussão sobre isso nos comentários referentes ao post.

Traduzido por Klaus Barretto Lopes

Professor Visitante da Universidade de Manchester, Inglaterra, Reino Unido

Instrutor de Ortodontia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil

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