A tipo de pisada está relacionada à má-oclusão!
De vez em quando eu me deparo com alguns artigos estranhos. Esse novo artigo observou a associação entre o tipo de pisada e a má-oclusão.
Os autores desse artigo começaram afirmando que os distúrbios funcionais dos músculos mastigatórios poderiam ser transmitidos a outros músculos por meio de “cadeias musculares”. E que isso também poderia ser revertido e que o sistema dentário poderia ser influenciado por desequilíbrios em outras áreas do corpo. Então, eles sugerem que a correção da má-oclusão mais cedo pode minimizar ou eliminar a necessidade de futuros tratamentos. Assim, precisamos avaliar e corrigir mais cedo a posição da pisada.
Um grupo da Espanha fez o estudo que foi publicado pelo Medicine Journal.
Ana Marchena-Rodriguez et al.
Medicine: Doi http://dx.doi.org/10.1097/MD.0000000000010701
Eles fizeram o estudo para responder à pergunta:
“Existe correlação entre a posição de pisada, os parâmetros de pegada e a má-oclusão anteroposterior?”
O que eles fizeram?
Eles fizeram um estudo transversal com 189 crianças entre seis e nove anos de idade, que foram selecionados aleatoriamente numa escola em Málaga. Eles abordaram os pais das crianças usando um questionário, que fez uma série de perguntas sobre a posição de pisada, respiração etc., e se isso influenciava no critério de inclusão/exclusão. Foi um questionário extenso.
Então, eles examinaram as crianças em suas escolas. Eles mediram o seguinte:
- Índice de postura dos pés (FPI): Avalia a natureza da posição da pisada em 3 planos no espaço. Um podólogo expertfez as medidas.
- Ângulo de Clark: O podólogo expertmediu isso a partir de um traçado sobre um pedigrama.
- Classificação de Angle: Um ortodontista coletou esses dados.
O ortodontista e o podólogo foram cegados para as outras medições.
Eles escolheram o pé direito para a análise e mediram a associação entre as variáveis com a Correlação de Pearson.
O que eles encontraram?
Eles encontraram que 67% das crianças tinham uma relação molar de Classe I, 21% de Classe II e 10% de Classe III. Eles apresentaram os dados do ângulo de Clark e FPI como dados paramétricos e, então, fizeram um teste não-paramétrico entre os grupos de Classificação de Angle (mas isso não mede a associação). Aqui estão os dados numa tabela importada:
Eu pesquisei sobre os valores normais para o FPIe, em crianças, ele é 3,7 (DP=2,5). Os valores que eles relataram estão dentro dessa variação.
A análise estatística deles revelou que existiu uma associação entre FPI, o ângulo de Clark e a classificação dentária. Então, eles concluíram:
“O ângulo de Clark diminui na medida em que a Classificação de Angle aumenta da Classe I para a Classe III, enquanto a FPI é maior na medida em que a Classificação de Angle aumenta da Classe I para a Classe III”.
Esta afirmação é importante, pois eles sugerem que a Classificação de Angle, que é uma escala nominal, “aumenta”. Isso é um erro, pois uma escala nominal não pode aumentar.
Na verdade, a apresentação dos dados e a análise estatística foram confusas e possivelmente incorretas.
O que eu pensei?
Nos últimos anos, eu participei de muitos debates neste blog com a Ortodontia “marginal”. Assim como outras pessoas, eu tenho pedido, consistentemente, por evidências para dar suporte às suas teorias. Alguns dos praticantes marginais sinalizaram e, para ser sincero, se isso é o melhor que pode ser feito, então não existe evidência para suportar as teorias. As principais deficiências do artigo são:
- Eles não forneceram detalhes suficientes de como eles selecionaram a população de crianças;
- A análise estatística e a apresentação dos dados são confusas;
- Associação não é causalidade;
- Os valores do FPI estavam dentro da variação da população normal;
- O uso da Classificação de Angle é um erro importante, pois ela pode ser influenciada por muitos fatores de confusão, como, por exemplo, dentes ausentes e cáries dentárias. A não ser que a posição de pisada influencie nas cáries!
- É importante ressaltar que a hipótese que eles estavam testando não é baseada em dados de pesquisa, nem mesmo em sabedoria convencional. Isso é importante, pois se conduzirmos um número suficientemente grande de estudos procurando por algo, então o acharemos!
Eu sei que o meu ponto de vista vai causar alguma discussão. Vamos mantê-la científica?
Finalmente, eu decidi revisar alguns artigos da “Ortodontia marginal” durante o verão. O próximo vai ser um artigo feito pela London School of Orthotropics sobre a prevenção de impacção dos caninos com Ortotropia.
Traduzido por Klaus Barretto Lopes
Instrutor de Ortodontia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
Emeritus Professor of Orthodontics, University of Manchester, UK.