Seria a higiene oral influenciada pelo Invisalign ou pelos braquetes auto-ligáveis?
Todos nós nos preocupamos com a higiene oral dos nossos pacientes. Mas seria ela influenciada pelo tipo de aparelho que escolhemos para os nossos pacientes? Um novo estudo traz novas informações sobre esta pergunta.
Tem sido sugerido que a escolha do aparelho pode influenciar na habilidade dos nossos pacientes de manter a higiene oral. Isso seria particularmente relevante para os aparelhos removíveis, uma vez que podem ser removidos com mais facilidade para se escovar os dentes. Assim, algumas afirmações estão sendo feitas de que os alinhadores reduzem os problemas de higiene oral/periodontal. Este foi o tema do presente estudo.
Um grupo de Connecticut fez o estudo. O AJO-DDO publicou o artigo em fevereiro.
Which orthodontic appliance is best for oral hygiene? A randomized clinical trial
Aditya Chhibber et al
Am J Orthod Dentofacial Orthop 2018;153:175-83
https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2017.10.009
Eles fizeram o estudo para responder à pergunta:
“Existe algum efeito dos alinhadores transparentes, braquetes auto-ligáveis e braquetes convencionais sobre a higiene oral?”
O que eles fizeram?
Eles fizeram um estudo clínico randomizado com três braços e alocação de 1:1:1. A PICO foi:
Participantes: Pacientes em tratamento ortodôntico na dentição permanente
Intervenção: Invisalign
Comparador: Braquetes auto-ligáveis ou braquetes convencionais
Desfecho: Medidas periodontais. O desfecho primário foi o Índice de Placa (IP), os desfechos secundários foram o índice gengival (IG) e o índice de sangramento gengival (ISG).
Eles coletaram os dados dos segundos pré-molares superiores antes do tratamento (T0), após 9 meses (T2) e após 18 meses (T3).
Eles fizeram o cálculo do tamanho da amostra. Foi feita uma randomização pré-preparada em blocos para garantir uma distribuição igual entre os grupos. Quando um paciente consentia, os investigadores telefonavam ou enviavam mensagem de texto para ele, o informando para qual tratamento tinha sido alocado. Portanto, os investigadores foram independentes da alocação etc.
Não foi possível cegar o ortodontista que tratava para a intervenção. Eu também achei que as medidas periodontais não foram feitas de maneira cega. Isso é importante e devo retornar a isso mais tarde.
Eles fizeram uma análise de intenção de tratamento complexa, que levou em consideração os fatores de confusão.
O que eles encontraram?
Eles recrutaram 71 pacientes para o estudo. Infelizmente, eles nem sempre alocaram a intervenção correta para os pacientes. Consequentemente, eles perderam 10 pacientes no estudo. Tal perda foi desequilibrada onde 5 pacientes do grupo dos auto-ligáveis ficaram sem receber os braquetes auto-ligáveis.
Eles encontraram que existiram diferenças em todas as medidas de desfecho entre os braquetes e o Invisalign após 9 meses. Porém, após 18 meses não existiram diferenças. Eles mostraram isso nesses belos gráficos.
No geral, os autores concluíram que não existiu diferença significativa no nível de higiene oral entre os alinhadores transparentes, os braquetes auto-ligáveis e os braquetes convencionais após 18 meses de tratamento ortodôntico.
O que eu achei?
Este foi um estudo ambicioso e difícil. Eu acho que os autores fizeram um bom trabalho e os resultados são interessantes. Eles também ressaltaram claramente as limitações do estudo e não fizeram afirmações exageradas sobre os achados.
Nós agora precisamos considerar se este estudo nos traz informação de alta qualidade. Como de costume, vou começar a discussão com os pontos positivos do estudo. Em primeiro lugar, eles abordaram a maioria dos aspectos do estudo tais como uma boa randomização, recrutamento e alocação. A análise estatística foi apropriada e incluiu uma análise de intenção de tratamento.
Eu então procurei por vieses que poderiam influenciar. O mais relevante foi que os examinadores não foram cegados para a alocação do tratamento quando obtiveram as medidas de desfecho. Isso é importante, pois os examinadores podem ter inserido um viés interno com relação ao tipo de intervenção, podendo ter medido os resultados de forma diferente. Porém, também é difícil de ver como eles poderiam ter cegado os dados obtidos da placa uma vez que isso era uma medida clínica e o examinador foi obrigado a ver os braquetes/alinhadores.
Outro fator importante foi que os participantes sabiam que a higiene oral deles estava sendo monitorado por estarem participando de uma pesquisa. Isso é um problema comum em pesquisas e é chamado efeito Hawthorne. Eu não estou tão preocupado com relação a isso, pois todos os pacientes submetidos a tratamento ortodôntico têm a sua higiene oral monitorada. Sendo assim, o efeito Hawthorne pode não ter tido uma grande influência.
Finalmente, eu não sei bem as razões pelas quais 10 dos participantes não receberam a alocação correta de tratamento. Isso pode ter sido um erro simples. Por outro lado, o operador pode não ter sido imparcial e ter decidido prescrever o tratamento por sua própria escolha ao invés de alocar pela randomização. Isso pode ter resultado em viés.
Resumo
Eu pensei sobre todos esses fatores e achei que existiram problemas com o cegamento e a alocação do tratamento. Isto introduziu incerteza e devemos ter isso em mente quando interpretarmos os resultados.
Eu fiquei surpreso em ver que as medidas de higiene oral não foram melhores no grupo Invisalign. Entretanto, os autores ressaltaram que os seus achados foram similares aos de outros estudos, sugerindo que o tratamento com os alinhadores não facilita a prática de uma boa higiene oral.
Como em vários estudos, eu acho que “a pessoa que usa ou ativa o aparelho tem um maior efeito do que o aparelho”.
Traduzido por Klaus Barretto Lopes
Instrutor de Ortodontia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
Professor Visitante da Universidade de Manchester, Inglaterra, Reino Unido
Emeritus Professor of Orthodontics, University of Manchester, UK.