Os aparelhos de contenção e as extrações ortodônticas reduzem os níveis ósseos marginais?
Os aparelhos de contenção e as extrações ortodônticas reduzem os níveis ósseos marginais?
Esse post é sobre um estudo novo que investiga os efeitos dos aparelhos de contenção e das extrações sobre os níveis ósseos marginais. Eu achei isso bem interessante, pois foi incluída uma avaliação dos efeitos das extrações.
Um dos meus posts mais populares foi sobre métodos de contenção ortodôntica. Eu ressaltei que não existe um alto nível de evidência para nos ajudar na decisão do tipo de contenção que usamos. Além disso, nós sabemos que, mesmo que as contenções contribuam para o acúmulo de placa, não significa que vá ocorrer doença periodontal. Eu fiquei muito interessado em ver esse novo estudo que um grupo de Gotemburgo, na Suécia, publicou no AJO-DDO.
Anna Westerland et al.
Am J Orthod Dentofacial Orthop 2017;151:74-81.
DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.ajodo.2016.06.029
Eu achei a revisão da literatura muito boa. Eles ressaltaram que nós temos um conhecimento limitado sobre os efeitos adversos dos aparelhos de contenção fixos na saúde oral. Eles também questionaram se o fato dos dentes serem mantidos presos uns aos outros com a contenção fixa poderia ser prejudicial à saúde periodontal. FInalmente, eles sugeriram que a pesquisa anterior foi de alguma forma limitada, pois a medida de desfecho primária foi a altura do osso marginal obtida de radiografias bidimensionais.
Os autores fizeram esse estudo para descobrir se os aparelhos de contenção fixos tinham algum efeito adverso sobre o osso marginal dos incisivos inferiores utilizando a tomografia computadorizada de feixe cônico.
O que eles fizeram?
Eles estudaram pacientes que tinham terminado o tratamento entre 1998 e 2002. Foram incluídos pacientes tratados com aparelho fixo que tinham a documentação de antes e depois do tratamento, modelos de estudo e radiografias de perfil.
Com pelo menos dez anos após a conclusão do tratamento ortodôntico, os pesquisadores chamaram novamente os pacientes e mediram os níveis de osso marginal utilizando tomografia computadorizada de feixe cônico. O estudo também teve um componente retrospectivo, pois eles observaram possíveis variáveis preditivas sobre os níveis ósseos.
Eles dividiram os pacientes em três grupos:
- Contenção fixa multi-filamentada colada de canino a canino;
- Sem contenção;
- Grupo controle de pessoas não tratadas.
O nível ósseo marginal foi o desfecho primário. A medida foi obtida por tomografia computadorizada de feixe cônico.
Eles selecionaram muitas variáveis preditivas de antes do tratamento. Elas foram: a presença de contenção; irregularidade dos incisivos; angulação dos incisivos; variáveis cefalométricas selecionadas e se os pacientes tinham feito extrações.
Eles conduziram uma estatística complexa e apropriada.
O que eles encontraram?
Eles encontraram diferenças estatisticamente significativas nos níveis de osso marginal entre os grupos. Importante ressaltar que os níveis ósseos marginais mais baixos foram menores tanto para os grupos com contenção quanto para os sem contenção quando comparados ao grupo controle. Entretanto, não houve diferença entre os grupos com contenção e sem contenção. Eu coloquei alguns dos dados na tabela abaixo:
Marginal bone loss (means and 95% CI)
Variável | Contenção | Sem contenção | Controle |
Todas as superfícies (mm) | 11,3 (10,46 to 12,14) | 11 (9,7 to 12,3) | 8,74 (7,1 to 10,2) |
Buccal surfaces (mm) | 4,2 (3,74 to 4,66) | 3,88 (3,03 to 4,57 | 2,57 (1,8 to 3,2) |
Eles também mostraram que a redução do osso marginal foi associada à rotação posterior da mandíbula, ao padrão de crescimento vertical, às extrações, à retroinclinação dos incisivos e ao alto índice de irregularidade no início do tratamento.
Eles concluíram:
‘A contenção, em geral, não parece causar nenhum efeito adverso nos níveis de osso marginal após dez anos de tratamento ortodôntico’.
O que eu penso?
Esse estudo nos fornece informações úteis. Entretanto, antes de eu interpretar os resultados, precisamos ter em mente o tipo de desenho de estudo que eles adotaram. É importante considerar que esse é um estudo retrospectivo. Consequentemente, ele tem um viés de seleção. Por exemplo, eles somente selecionaram os pacientes com a documentação completa. Nós não sabemos sobre os pacientes cuja a documentação estava incompleta. Em segundo lugar, foi um estudo transversal. Isso significa que nós não sabemos nada sobre a perda do osso marginal ao início e ao final do tratamento ortodôntico.
Os autores ressaltaram estes problemas no estudo deles em sua agradável discussão. Mesmo assim, os resultados são muito interessantes. É importante ressaltar que as contenções fixas não causaram danos. Isso é consistente com os achados de uma outra pesquisa e nós estamos começando a construir uma imagem mais clara sobre essa questão clínica.
Entretanto, a grande “manchete” foi que a extração e a retroinclinação dos incisivos inferiores tiveram associação com a perda óssea. Mas antes de todos nós ficarmos muito excitados com esse dado, se faz importante considerar que a irregularidade de antes do tratamento também foi associada à perda óssea. Existe uma possibilidade de que isso possa ter levado à perda do osso alveolar.
Nós também precisamos considerar o tamanho do efeito e se isso é clinicamente significante. Para as superfícies vestibulares dos incisivos a perda óssea foi de 1,7 mm. Eu não sei se isso é clinicamente significante e caberá aos clínicos decidirem por eles mesmos.Mesmo assim, eu realmente acho que esses dados são muito interessantes e, certamente, merecem ser estudados em um estudo prospectivo de longo prazo.
Isso muda a minha conduta clínica?
Finalmente, esse estudo vai mudar a minha conduta clínica? Eu acho que esse é um estudo pequeno que está sujeito ao viés de seleção e tem um alto nível de incerteza. Consequentemente, eu não vou mudar a minha conduta clínica, mas, com certeza, isso vai me fazer pensar.
Eu acho que agora vai ter uma discussão animada sobre estes achados nos comentários desse blog.
Traduzido por Klaus Barretto Lopes
Professor Visitante da Universidade de Manchester, Inglaterra, Reino Unido
Instrutor de Ortodontia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
Emeritus Professor of Orthodontics, University of Manchester, UK.