Tratamento da Classe II com ancoragem esquelética: Uma possibilidade ou uma necessidade?
Os aparelhos funcionais são um método já bem estabelecido para a correção da Classe II, mas eles possuem problemas. A utilização de mini placas para a aplicação das forças de Classe II seria um método de tratamento?
Os aparelhos funcionais são um método relativamente efetivo de tratar a má-oclusão de Classe II. A efetividade deles já foi estudada em vários estudos e revisões sistemáticas. Após toda esta pesquisa, eu acho que tal área não é tão controversa como algumas pessoas sugerem. Porém, estes investigadores descreveram uma nova técnica para corrigir os problemas da Classe II utilizando mini placas colocadas na maxila e na mandíbula. Eles fizeram sérias alegações sobre a efetividade deste tratamento e, assim, eu dei uma olhada bem cuidadosa neste artigo.
A novel approach for treatment of skeletal Class II malocclusion: Miniplates-based skeletal anchorage Abdullsalam Abdulqawi Al-Dumaini et al
Am J Orthod Dentofacial Orthop 2018;153:239-47
https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2017.06.020
Um grupo da Syria e do Yemen fez este estudo.
Os autores declararam um conflito de interesses, pois eles patentearam esta técnica.
O que eles perguntaram?
Eles fizeram o estudo para perguntar:
“Qual é o efeito de corrigir a má-oclusão de Classe II com forças de Classe II suportadas por mini placas?”
O que eles fizeram?
Eles conduziram um estudo cohort prospectivo. A PICO foi:
Participantes: Pacientes entre 10 e 13 anos de idade com má-oclusão de Classe II esquelética;
Intervenção: Tratamento com mecânica de Classe II com ancoragem esquelética;
Comparador: Grupo controle sem tratamento. Não foram dados detalhes no artigo;
Desfecho: Múltiplas medidas cefalométricas.
Eles utilizaram a prescrição MBT para alinhar e nivelar os arcos. Então, eles fixaram mini placas ortopédicas na mandíbula e na maxila. Após 28 dias eles aplicaram nas mini placas forças elásticas de 250 g por 3 semanas, 350 g por mais 3 semanas e, finalmente, 450 g por lado pelo resto da fase funcional.
Os dados cefalométricos foram coletados após o alinhamento e o nivelamento com os aparelhos fixos e após o overjet ter reduzido para valores entre 1 e 3 mm. Eles compararam 23 medidas cefalométricas com o teste “t”.
O que eles encontraram?
Este foi um estudo cefalométrico que comparou muitas medidas com estatística uni-variada. Isso significa que existe uma grande chance de se obter achados falso-positivos ocorridos ao acaso. Precisamos ter isso em mente quando olharmos os dados.
Primeiramente, quando eles compararam o grupo tratado ao não-tratado, pareceu que 10 das 20 medidas foram significativamente diferentes. Eu não vou analisar tudo isso, porém, o SNB foi 2 graus maior no grupo controle. Então, eles compararam as mudanças nos dois grupos e todas as medidas foram diferentes. Eles também avaliaram as mudanças nos dois grupos e, mais uma vez, quase todas as medidas foram estatisticamente significativas.
Os autores concluíram que:
“A ancoragem com mini placas na maxila e na mandíbula promoveu a correção da Classe II esquelética, principalmente, devido às mudanças esqueléticas”.
O que eu pensei?
Primeiramente, eu achei que este estudo tinha o potencial para ser um estudo cohort realmente bom que poderia levar ao aprofundamento do desenvolvimento desta técnica e os autores deveriam ser parabenizados por fazer este trabalho.
Porém, uma das razões pela qual eu escrevo este blog é para ajudar a interpretar os resultados que são publicados na literatura. Geralmente eu tento ser construtivo, a menos que o estudo seja seriamente falho e promova erradamente um tratamento caro. Eu também tento ser objetivo e não muito crítico. Entretanto, quando analisei este estudo, não pude concordar com a conclusão.
Eu tenho duas preocupações principais. A primeira é com a escolha do grupo controle. Os autores não deram nenhum detalhe de como este grupo foi selecionado. A única referência dada foi a uma tese e não consegui obter uma cópia. Além disso, havia muitas diferenças entre os grupos controle e tratado antes do tratamento. Em segundo lugar, eles analisaram de maneiras diferentes muitas medidas cefalométricas e, então, escolheram importantes variáveis para discutir. Eu acho que isso me levou a achar difícil identificar como eles chegaram a conclusão deles.
Eu também gostaria de ver alguma informação sobre as percepções dos pacientes sobre os aparelhos deles. Isto é um resultado importante que deveria ser considerado, principalmente em estudos que são invasivos.
Finalmente, eu devo continuar usando o Twin Block para a correção da Classe II. As pesquisas mostram que ele funciona e não é tão traumático quanto a colocação de mini placas ancoradas ao osso. Mas seria ótimo ver mais pesquisas sobre esta técnica.
Traduzido por Klaus Barretto Lopes
Instrutor de Ortodontia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
Emeritus Professor of Orthodontics, University of Manchester, UK.