April 12, 2018

O AJO publicou um novo estudo sobre o AcceleDent: Vamos fazer uma análise crítica dele!

Eu já postei várias vezes sobre pesquisas referentes a métodos de se fazer os dentes se moverem mais rápido. Este novo artigo nos traz informações sobre o tempo total de tratamento com o AcceleDent.

A Ortodontia está evoluindo constantemente. Recentemente, foram desenvolvidos alguns métodos para se tentar reduzir o tempo de tratamento. Estão incluídos aí os traumas localizados, as pílulas e as poções, o laser e as vibrações. Apesar dos anúncios dos fabricantes e de outros interessados, a maioria das pesquisas recentes tem mostrado que não existe evidência que tais inovações tenham um efeito clínico significativo.

Recentemente, eu escrevi sobre um estudo que observou o efeito da vibração sobre o tratamento com o Invisalign. Este post atraiu uma quantidade considerável de críticas na mídia social. De fato, as pessoas me acusaram de viés, pois eu não estava sendo crítico com as pesquisas que reforçavam as minhas opiniões sobre a introdução de novas tecnologias sem testá-las. Assim, eu considerei este comentário seriamente e eu farei uma análise bem crítica deste artigo.

Effects of supplemental vibrational force on space closure, treatment duration, and occlusal outcome: A multicenter randomized clinical trial

DiBiase et al

Am J Orthod Dentofacial Orthop 2018;153:469-80

https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2017.10.021

Vou declarar um conflito de interesses, pois conheço bem vários membros do grupo.

Um grupo de Kent, no belo sul da Inglaterra, fez este estudo.

Study team out for a good walk!

Em sua revisão da literatura eles ressaltaram que vários estudos tinham sido feitos sobre o AcceleDent. É importante lembrar que os primeiros estudos não foram randomizados, foram retrospectivos e sugeriam que o AcceleDent tinha um efeito. Estes estudos foram seguidos de estudos clínicos que não encontraram evidência de efeito benéfico. Todos estes estudos se preocuparam com uma avaliação dos estágios do tratamento ortodôntico, como, por exemplo, as taxas de retração dos caninos, alinhamento e fechamento de espaço. Nenhum estudo observou o processo total e o resultado do tratamento. Eu achei que este estudo foi importante, pois eles observaram isso ao perguntar a seguinte questão:

“Qual é o efeito do aparelho AcceleDent sobre os resultados do tratamento com os aparelhos ortodônticos fixos?

O que eles fizeram?

Eles fizeram um estudo clínico randomizado. A PICO foi:

Participantes: Pessoas com menos de 20 anos de idade com má-oclusão que precisava de tratamento com aparelhos ortodônticos fixos. Eles tinham apinhamento inferior com necessidade de extração de pré-molares.

Intervenções: Elas foram (i) AcceleDent, (ii) AcceleDent falso, (iii) tratamento convencional. Todos os pacientes foram tratados com braquetes MBT Victory com consultas de controle a cada 6 semanas.

Desfecho: O desfecho primário foi a taxa de fechamento de espaço inferior. Os desfechos secundários foram (i) taxa de fechamento de espaço, (ii) duração do tratamento em meses e (iii) Índice PAR.

Eles utilizaram marcadores de tempo embebidos nos dispositivos AcceleDent para medir a colaboração. Infelizmente, eles não funcionaram.

Eles fizeram um cálculo de tamanho de amostra baseados na taxa de alinhamento inferior. Este foi o desfecho de um artigo prévio desta pesquisa. Assim, este artigo relatou os desfechos na ausência de um específico cálculo de tamanho de amostra. Os autores ressaltaram que o cálculo do tamanho da amostra de um estudo prévio de fechamento de espaço sugeriu que esta parte do estudo deles possuiu um poder adequado.

Eu retornarei a isto mais tarde, pois é muito importante.

Eles fizeram uma randomização pré-preparada remota e a alocação foi ocultada dos operadores. Não foi possível cegar os operadores ou pacientes para a alocação do tratamento. Porém, todos os dados foram cegados na coleta dos dados. Eles conduziram análises “por protocolo” e de “intenção de tratar”. É importante ressaltar que foi feita uma análise de regressão relevante que levou em conta os efeitos de potenciais fatores de confusão, tais como, operador, má-oclusão inicial, etc.

O que eles acharam?

Eles relataram que 81 pacientes iniciaram o estudo e 61 permaneceram ao final do estudo. Esta foi uma taxa de conclusão de 75%.

Eles apresentaram uma análise muito detalhada dos dados e eu extraí os desfechos mais importantes na seguinte tabela:

 

AcceleDent AcceleDent falso Fixo apenas
Taxa de fechamento de espaço mensal (mm/mês) 0,82 0,68 0,95
Duração do tratamento (meses) 20,45 16,73 17,64
Índice PAR final 3,0 3,0 3,0

 

A extensa análise estatística revelou não existir diferença entre os grupos para nenhum desfecho.

Eles ressaltaram que as taxas de fechamento de espaço e a duração de tratamento foram similares às de outros estudos.

Finalmente, eles chamaram a atenção para as limitações do estudo na discussão.

O que eu achei?

Como em qualquer estudo, existem pontos fortes e limitações. Precisamos nos lembrar que a principal vantagem dos estudos clínicos controlados sobre os outros desenhos de estudo é que os vieses são minimizados. É importante lembrar que não é possível remover todos os vieses e se fazer um estudo perfeito. Portanto, vai depender de nós fazer a interpretação de todos os estudos na presença de qualquer limitação.

Quais são os pontos fortes?

Primeiramente eu vou analisar os pontos fortes. O mais importante foi que ele foi um estudo multicêntrico, feito com múltiplos operadores na clínica, trabalhando com protocolos normais. A randomização, a alocação e o ocultamento foram todos bons. Eles coletaram os dados de forma cega. Também conduziram uma análise de dados relevante e sofisticada que foi feita como “por protocolo” e “intenção de tratamento”. Também acho que foi importante os autores não terem recebido nenhuma verba da OrthoAccel e nem serem líderes formadores de opinião pagos pelas empresas. Além disso, o AJO-DDO publicou o artigo e esta é a nossa revista mais importante na Ortodontia, com uma reputação de alta qualidade.

Quais foram as limitações?

Os autores chamaram a atenção para as limitações do estudo. Eu achei que a mais importante foi o cálculo do tamanho da amostra. Eles não o basearam nos desfechos que eles mediram nesta parte do estudo. Isso significa que existe um risco de que o estudo não tenha poder suficiente para identificar qualquer significância estatística entre os grupos. Eles fizeram cálculos de outros estudos para justificar a amostra deles e isso foi reconfortante. Porém, nós também temos que considerar o tamanho do efeito da intervenção. Ele foi pequeno. Assim, estou bem confiante nos achados deles.

Outro problema é que a os marcadores de colaboração não funcionaram. De fato, isto foi levantado pelos líderes formadores de opinião da AcceleDent quando a primeira parte do estudo foi publicada. Meu sentimento é que ainda que pudesse ter sido útil se obter os dados sobre a cooperação, eles não são essenciais. Isso porque o estudo estava medindo o efeito de dar ao paciente uma intervenção para ele usar. Isto é parecido com um estudo sobre fármacos no qual os pacientes recebem uma droga auto administrável. Não sabemos se eles tomaram o remédio. É importante lembrar que isso é o que acontece no mundo real e estes estudos têm validade.

Eu achei que as outras limitações foram menos importantes, sendo minimizadas, em certo grau, devido à randomização.

Resumo

Precisamos considerar os resultados deste estudo levando em conta os outros RCTs. Agora já existem vários estudos e todos chegam na mesma conclusão. Existe ausência de evidência de um efeito clinicamente significativo do AcceleDent sobre a movimentação dentária.

Traduzido por Klaus Barretto Lopes

Instrutor de Ortodontia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil

 

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